terça-feira, 22 de janeiro de 2008

religião e sacrifício


"...Às vezes, perguntam-me o que é que eu penso sobre o gesto daquela gente que, em Fátima, se arrasta de joelhos ou até só se arrasta pura e simplesmente...
A resposta é simples: evidentemente, tenho compreensão sincera e compassiva (no sentido etimológico da palavra compaixão) para com aqueles e aquelas que, no abismo da sua dor ou tragédia, se convenceram de que, arrastando-se diante da divindade, a comoveriam e forçariam a libertá-los... Mas também é evidente para qualquer ser pensante que um Deus que, para ser favorável ao ser humano, precisasse de toda aquela humilhação e tortura era um Deus sádico, que, por isso mesmo, não poderia merecer consideração nem respeito. Perante um Deus sádico, só há uma atitude humanamente digna: que passe bem sem nós... No entanto, foi pregado tonitruantemente ao longo de demasiado tempo que Deus precisou do sangue do próprio Filho para aplacar a sua ira divina... Pergunta-se: como é que foi possível pregar e acreditar num Deus vingativo e sádico, um Deus pior que qualquer pai humano sadio, decente?...
É evidente que Jesus não morreu na cruz para aplacar a ira de Deus. Jesus foi vitima da maldade dos homens e mulheres, e não da ira de Deus... A cruz de Cristo é a expressão máxima do amor incondicional de Deus para com todos os homens e mulheres. Jesus, o excluído, é aquele que não exclui ninguém. Pelo contrário, inclui a todos no amor sem condições... É isso: o sacrifício pelo sacrifício é detestável. Mas, por outro lado, nada vale realmente sem sacrifício. Por causa do império de uma banalidade mole hoje triunfante, é recusado a muitos o sabor daquela alegria que resulta da superação dos obstáculos... De facto, na de grande, belo e valioso e digno se faz e constrói no mundo sem sacrifício. Os valores merecem que nos batamos por eles, e é esse sacrifício enquanto luta por aquilo que vale que nos engrandece como seres humanos... Quem diz que ama e não está disposto a sacrificar-se por aquele que ama anda enganado e mente a si próprio. Quem ama verdadeiramente está disposto a sacrificar-se por aquele, por aquele, por aqueles que realmente ama. É esse amor que salva o mundo e faz novas todas as coisas. Mas aí, quando se ama, a cruz é leve... Àqueles que o criticavam por participar em banquetes oferecidos por pecadores públicos Jesus respondeu: “Ide aprender o que significa: O que eu quero é misericórdia e não sacrifício”. Jesus também disse: “Quem quiser seguir-me tome a sua cruz todos os dias”. Referia-se àquela cruz que dá testemunho da verdade e que acompanha o combate pela liberdade, pela dignidade, pela justiça, pela criação, pelo amor...”

In JANELA DO (IN)VISÍVEL
Por
Pe. ANSELMO BORGES

(porque o subscrevo)

1 comentário:

Ai e Tal... disse...

O que é necessário é conseguir estabelecer uma distinção entre fé e religião... Se não se tem presente a diferença entre estes dois conceitos, é impossível viver de uma maneira minimamente consciente...!!! É o problema de muito boa gente... O que está escrito é para ser levado à risca (religião), sem se preocuparem minimamente com o que querem na verdade (que é o que a fé nos traz). Tenham fé... Mas não sejam estúpidos ao ponto de pensarem que a auto-flagelação é a solução dos problemas... Com a fé (seja no que for) e com "trabalho" consegue-se atingir, normalmente, tudo... Isto sim é o importante...!

***MUAH*** Bom texto...